sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

máquina de sonhos

os vivos eventualmente
sonham com a morte
(que mesmo morta

ainda é quente)
com a partida
na qual se deixa uma parte
que mesmo branda
é sempre dolorida
pois deixa-se aqui
tudo que cabe apenas
na vida
móveis cabelos beijos
violões e lençois
ao partir
some o medo de perder
pois ao morrer
ganha-se tudo
inclusive a eternidade
de viver como os mortos
(que mesmo mortos
vivem)
em sua atarefada
– e fantástica –
rotina repetida
de sonhar e inventar
sua própria vida.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

visita

hóspede extremoso
todo vazio
é meio espaçoso

terça-feira, 27 de novembro de 2012

crepúsculo

uma coisa é dizer
a palavra crepúsculo
– reduzida estritamente
às suas letras
fonemas e sintaxe –
pois toda palavra falada
diz muito pouco
(ou quase nada)
produz apenas ruídos
entendidos por nós
mecanicamente
sendo assim
o crepúsculo falado
produz um significado
que constrói um crepúsculo
imaginado 
mas deficiente e incompleto
falta-lhe o que a natureza
dos ouvidos 
(e do papel)
não comporta:
o excesso de vida.

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

novembro (as mãos de Gullar)

se hoje vejo imagens
em poesia
foi Gullar
com sua maestria
de incrustar nas palavras
quadros minúsculos com paisagens
e de transformar versos
(ao tocarem o papel)
em centenas de milhares
de atalhos para tocarmos o céu.
num 18 de novembro
– na Avenida Paulista –
apertei as mãos
que escreveram
datilografaram
– e em mim
indiretamente
e permanentemente
gravaram – 
tantos poemas
as mesmas mãos
que transformaram o espanto
do cheiro de tantos jasmins
do olor do sabor das frutas
(até das bananas podres)
em mágica e lutas.
naquele dia
tudo virou
poesia.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

insônia

não é o calor
não é o frio
não é o som
dos cachorros
no cio
não é a luz
da cozinha
que vaza
pro quarto
não é o bebê
da vizinha
chorando alto
não é o estalo
da TV e do DVD
às duas e pouco
bem que poderia
mas quem rouba
o sono
é a cama
vazia.

meditação

elimine o peso
corte o que
te prende
– sejam raízes
bocas olhos
noites ou países –
elimine o peso
esqueça a gravidade
de assuntos perdas
problemas
da saudade
elimine o peso
quanto mais leve
a gente ficar
mais chances tem
de voar.

esquecimento

não há como
tornar desconhecido
algo
–em algum dia–
vivido.
tudo fica retido
mesmo que
acontecido
num breve
espaço de tempo
no piscar
de um momento.
a menos
que a gente
empurre
nada cai
no esquecimento.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

basta

bastam
minhas mãos
com as suas
em cima
para transformar
medo em rima.
bastam
as pontas
dos seus dedos
para o Sol nascer
mais cedo.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

arestas

é do amor
esculpir
não parar
até aparar
as arestas
para que
os dedos
se encaixem
melhor.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

entrevada

a vida
entrevada
em si mesma
paralítica
se arrasta
no espaço
pífio
dos dias
no período
natimorto
das horas
viver
e seu
entendimento
não nos cabe
morrer
é a única coisa
que a gente
sabe.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

um ou quatro

nossos dedos
ainda encaixam
nossos beijos
ainda casam
estivemos
estaremos
estamos
vivendo
nosso primeiro mês
pela segunda vez

da passagem do tempo

você viu
o minuto
que sumiu?
o minuto
que estava aqui
há um minuto?
o minuto miúdo
que sumiu
mudo?
você viu
o minuto
perdido
na imensidão
dos minutos?
você viu
passar por aí
esse minuto?
um minuto bonito
desses que não dão
a todo minuto?
alguém viu
o minuto que sumiu?

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

mãos

as mãos são navios
que descobrem
as ondas do corpo
as tempestades do peito
as mãos são
piers portos portas
passagens para o abrigo
do plural
são a água que suaviza
o sal
o gás que colore
o céu
as mãos são portões abertos
porões recheados de mistério
as mãos são o perdão da vida
por passar assim breve
antes mesmo que possamos
entrelaçar os dedos.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

incomudar


o que
em comum
incomoda
se muda

tamanho único

se sobra
ou aperta
é bom
acostumar:
a vida
é tamanho único.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

pouco

viver
para não
querer
de tudo
um pouco
querer
de tudo
um todo
precisar de
um pouco mais
que um pouco.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

para sempre agora

não há coisa mais vã
que acreditar que o mundo
acontecerá só amanhã.
o futuro é um buraco
sem fundo
que consome exatamente
o que o alimenta.
por isso que as coisas vão
mas deixam uma dica:
para passar
o tempo não fica
fazendo hora.
para sempre
a vida
vai ser agora.

sobra

de todos
o melhor amor
é o que falta.
falta peito
pra caber
falta palavra
pra dizer
falta tempo
pra viver.
de todos
o melhor amor
é o que falta
o mesmo tanto
que sobra.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

fala

a palavra
também tem boca:
o poema.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

constatação II

amor é a constatação de como a vida é breve.

saudade

é o futuro do pretérito.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

fio

um fio de cabelo seu
nada se parece com você
(nunca se pareceu)
isso qualquer um vê.
de fato ele traz muito de você
seu DNA
suas células
seu genótipo
código genético
mas na prática
não traz seus olhos
sua boca
seus traços
a dimensão
dos seus braços
– nem mesmo
a beleza o volume
e o movimento
dos seus próprios cabelos
quando se encontram
com um sopro de vento.
mas aqui
sobre os lençóis
– iluminados pelo Sol –
esse fio que meus olhos encontram
esse mínimo pedaço de você
consegue te desenhar
te trazer tão inteira
tão completa
que me mostra que sua ida
sempre guarda(rá) o espaço
da sua volta.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

a não-queda de uma folha

manhã de outono
folha cai sem tocar o chão
uma borboleta

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

etc.

entre tantos
entretantos
postos ante
nossos
enquantos
agora quero
você do centro
aos cantos
às quinas
esquinas
o bem
e o mal
o tudo
etc.
e tal.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

poema pe(r)dido

em mim se perdeu
um poema
que quando escrito
diria tudo
que eu queria
ter dito
e de poema perdido
tornaria-se poema pedido
começado
no momento exato
em que retomamos
o contato
e no fim
terminaria
com você
dizendo sim.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

passinho

andei andando
errado
num passo
apertado
descompassado
procurando
na pressa
o amor
sem saber
que ele anda
a passos miúdos
quase parando
lentamente
só pra ele ficar
e o tempo passar
na frente.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

atenção

nasce um poema
a cada segundo
agora mesmo
ali na esquina
ou do outro lado do mundo.
pode falar de flor
pedir perdão
falar o que for.
basta prestar atenção
que logo se nota:
o poema acontece
é só olhar em volta.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

tamanho

aos olhos
dos céticos
sou apenas
o que meço
o que ocupo
no espaço.
ao amor
sou o que medem
meus versos
e não estranho
em desconhecer
meu próprio
tamanho.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

ir sem ir

porta afora
ante-
ontem
ontem
e agora
você vai.
ficando.
como se
saísse
entrando.
se fazendo
presente
justamente
por estar
ausente.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

lado

amor
é querer
o outro
ao lado
querer
do outro
o lado
de dentro.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

unidade de(s)medida

minha unidade
de medida
são teus dedos
tuas mãos
à medida em que
tocam os meus
as minhas
e deslizam gentilmente
sobre toda a superfície
do meu corpo
me fazendo existir realmente.
meu relógio é tua respiração
– a contração
e o relaxamento
do teu peito
em determinados momentos –
e a forma como ela
conduz o mundo no teu passo
num compasso manso
(quase mudo)
mas que dá voz a tudo
quando enche e esvazia
seu tórax numa certa frequência
– e por estarmos no mesmo ritmo
enche e esvazia o meu
por consequência.
minha referência de beleza
é a forma como cada centímetro
de você casa perfeitamente 
com a minha preferência
– principalmente quando
por entre os teus cabelos
reluz o sol
e transforma-os
numa espécie de farol
que me guia de noite
me guia de dia.
de tudo isso
esses padrões
referências e medidas
que com você aprendi
o mais curioso
é a forma como desaprendi
a ponderar essa vontade
que vem quando você
me invade.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

(dentro)

havia
um vazio
você viu?
havia
e eu
o via
ouvia
como se
falasse
como
se faltasse
em mim
um pedaço
de mim
quando
enfim
nós nos
recebemos
assim:
como se
faltássemos
em nós
mesmos.

constatação

é nos
desacordos
que eu
acordo.

entre

tudo in-
tenso
imenso
entre nós
entra em
nós
a alegria
de estarmos
todo dia
na mesma
sintonia
no mesmo
tom
mesmo
tão.

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

dança para parar o mundo

nós dois
a girar
para
o mundo
descansar
por um
segundo.

matéria-prima

num instante meu corpo
– de pele
ossos células músculos
e espanto –
esta carnadura
transformou-se
em nobre armadura.
uma completude
me tomou me tornou
uma espécie de receptáculo.
ninguém viu o espetáculo
(o momento exato)
em que determinada matéria
pulverizou-se por todo o oco
do meu corpo agora preenchido
por coisa que não se vê:
matéria-prima de você.

noite noite

tem noite que é
mais escura que a noite.
eventualmente
– deitado de bruços
sobre os braços
ou de lado –
ouço lentamente
o negrume que a mim
se une
e rasteja rente
ao pé da cama.
indago inseguro:
de onde vem
todo esse escuro?
da rua ou
das esquinas de mim?
da noite lá fora ou
da madrugada que dorme
(sob
sobre e dentro de)
mim?
enterro o rosto no colchão
pergunto alto aumento o tom
mas não me ouço
sumo por inteiro.
minha solidão
é um grito preso
no travesseiro.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

portas

ao escrever
o poeta
– sem querer
ou saber se deve –
desenha portas sob
o que escreve.
passagens que levam
às paisagens
– um beijo
uma flor ou
uma nuvem no céu –
que lhe ocorrem quando
a caneta toca o papel.
pois o poeta escreve
sobre o que vive
o que viu
sobre o que existiu
sem estar preparado
(naquele momento)
para deixar o que escreve
– o que descreve –
cair-lhe no esquecimento.
justamente por isso desenha portas
para ter a liberdade
de ir e vir
voltar abrir e fechar
quando tiver vontade.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

o beijo

I

inclinamos as cabeças
(a lados opostos)
para evitar que se toquem
os narizes
– que eventualmente
cumprimentam-se
com carinho
ainda que entrando
no meio do caminho –.
cuidadosos
alternamos os lábios
alternamos os lados
para que nada saia errado.
neste momento
cada um vai construindo
seu próprio movimento
– eu rodando daqui
você girando daí –.
no entanto, é nessa singularidade
nessa discordância
que nos encontramos de verdade
que vibramos na mesma frequência.

II

não há coisa melhor
que em cada beijo
ser você
a última e a primeira
imagem que vejo.

III

toda viagem
é pouca
– curta
demais –
quando
o céu
é o
da boca.

IV

todo beijo
é um poema
mudo.

V

de fato
nossas palavras
se chocaram
mas
nossos beijos
mostraram
que o amor
não está
à míngua
mostraram
que a gente
ainda fala
a mesma língua.

aos pedaços

entre copos
cacos entre
porta-retratos
baratos
rostos
rasgados
restos
de nós.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

deserto de nós

o peso
redutivo
do Sol
sobre
os ombros.
sua sombra
é o que
sobra.

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

não cabe

te levo nas brisas
e no clarão das manhãs
te levo nas flores
pelo caminho
e no canto dos pássaros
no topo das árvores
(mesmo quando cantam baixinho)
te levo nas nuvens
que formam desenhos no céu
te levo na chuva que lava
e nos sorrisos retribuídos.
o tempo todo te levo assim
– nas coisas todas –
pois o tanto que levo
mal dá pra caber em mim.

diferentes exatos momentos

passou-se tanto tempo
no entanto nossas mãos
ainda aderem como se nelas
houvesse um velcro
– que as prende gentilmente
sem acorrentá-las mas
sem permitir que
se soltem facilmente –.
nossas bocas ainda se recebem
com o mesmo cuidado antigo.
recebem-se como quando a boca
investiga uma fruta: de maneira sutil,
sem mordê-la apenas tateando-a
com os lábios e seu tato macio.
nossas peles ainda se atritam
se atraem como dois planetas
orbitando o mesmo sol e buscando
o calor que os faz vívidos que os ilumina
dos polos de baixo aos pelos de cima.
nossas pernas ainda se entrelaçam
formando uma trança uma trama natural
tal qual a que o vento forma
– em determinado momento
e deforma da forma mais bela possível –
seus cabelos quando sopra
e os coloca em movimento.
nossos olhos ainda se espiam
em silêncio como se vissem
o que há do lado de dentro
como se vissem que há um
no centro do outro.
nossos braços ainda se dão
ainda constroem casas portos
e fortalezas.
(nossos braços ainda protegem
as mesmas certezas).
passou-se tanto tempo
no entando é como se a vida
fosse a mesma
em diferentes exatos momentos.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

pressinha

ando com
uma pressa
de ter você
de
va
gar
zi
nho.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

destempos

o tempo não está
nos relógios
– como se pensa
de costume –.
está no clarão
das manhãs
num sorriso que relume.
o tempo está
sob os lençois
dos casais sob
a pele que a gente
dá ao sol dá aos céus.
o tempo está entre
os dedos entrelaçados
com os dedos
de algum alguém
num abraço apertado
daqueles que não se vive sem.
o tempo está naquilo
que a gente não vê a hora.
o tempo está
onde o tempo pára.

amor entre aspas

entre nós vibra um amor
que à sua volta afeta tudo
– inclusive move o copo d'água
sobre o criado mudo –.
um amor enérgico
que não aprendeu a se conter
(a se comportar)
por isso pediu nossos peitos
e resolvemos emprestar.
agora nos resta
viver tudo até as raspas
pra que um dia
quando forem falar de amor
peguem o nosso e coloquem entre aspas.

centro de gravidade

sinto que meu centro
de gravidade ganhou
teu rosto teu nome
e sobrenome.
é como se você exercesse
em meu peito tanto peso
tamanha pressão
que fosse o motivo pelo qual
meus pés se prendem ao chão.
– ao mesmo tempo basta
um beijo um toque
ou só você dizer que vem
pra me desprender do solo
e transformar tudo em nuvem
tudo em colo –.
pois a cada vez que você
se vai fica vindo
esta vontade repetida
de não soltar você
de não soltar a vida.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

despedida desmedida

mais
um dia
a menos.
a vida
é uma
despedida.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

em termos

deve haver algum engano
pra sermos menos
que nós mesmos,
sermos ermos sermos
menos que podemos ser.
em termos,
deve haver
deve haver algum engano.

se for, tem que ser tudo

entre quase e nada
a diferença
é de quase nada

clarão

um clarão se acende
com o teu sorriso
teu perfume
e leva embora a noite escura
(e seu frio negrume).
é como se dentro de você
cintilasse uma manhã de sol
amarelo-metálica
com o vento as brisas
e seu movimento
– que gentilmente penteia
os galhos e as folhas
das árvores –
com as gargalhadas das
famílias nos parques
com o vendedor de
algodão doce
– tão doce quanto
o canto dos bem-te-vis
que te veem bem por
isso cantam mais docemente –.
esse sol escondido em você
fulge lentamente
– e eventualmente –
escapa por entre as frestas
dos teus dentes
e vaza pelas brechas
dos teus olhos
– este clarão –
que chega a mim e me atravessa
aquecendo minhas células
num eterno verão.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

a inventar

um dicionário não diz
o que diz um silêncio a dois
um silêncio que manda a alma
deixar tudo pra depois.
e não diz não pelo silêncio
– em si
como ausência de som –
mas porque o verbo do peito
funciona de outro jeito
que não depende de fonemas
grafia pronúncia ou caligrafia.
o verbo do peito
deixa de lado a semântica
a sintaxe e os acordos ortográficos
pra deixar a vida acontecer
sem pedir licença
e sem depender
da natureza incompleta das palavras
e de sua presença.
pois da boca sai tão somente
o que se pode dizer
e muitas vezes ainda não inventaram
a forma falada de se dizer o que
sente.

poema morto

o poema
morre
no papel
pra (re)nascer
em alguém

terça-feira, 24 de julho de 2012

outro certo

certo reinventado
como planejei
tudo deu errado

segunda-feira, 23 de julho de 2012

o espaço

o mundo tem
espaço demais.
toneladas e toneladas
de uma feroz atmosfera
que reduz meus poucos quilos
e pouco mais de 1,70m
à cabeça de um alfinete
frente à infinidade deste
abismo mundano
que vive rodando sem sair
do lugar.
na rua fora da janela
lacunas e frestas de quase-vida
prontas para serem preenchidas
– nem que por apenas
uma vez –
pela matéria-prima
dos sonhos
– ou até mesmo
da rima –.
me pergunto:
de que me adianta
todo esse espaço
se o único que eu preciso
precisamente cabe você
e nem mais um cisco?

à/Dora

corpos colados
– tão colados
entranhados um
ao outro
enrolados –
que deu pra sentir
seu sangue circulando
seus órgãos funcionando
com calma
(deu pra sentir sua alma).
lentamente pedestres
ônibus carros trânsito
buzinas
– esse emaranhado
de barulhos esse
amontoado de matéria –
foi ficando de lado.
repentinamente
viver tornou-se mais simples
éramos só éramos dois
um só um nó.
sem mistério
ou qualquer significado
mais profundo.
pois naquele momento
a vida aconteceu
sem precisar
do mundo.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

poememória

um poema
não tem som,
mas se acerta o tom 
do teu peito,
logo vibra incandescente
e indiscutivelmente
ouves o efeito.
um poema também
não tem cheiro,
mas se eventualmente
traz em versos
uma flor e seu perfume
- talvez até uma moça
e seu perfume -
descola do papel um odor
impressionante e quase desconcertante
que embala o olfato numa viagem 
que nem mesmo a flor e seu perfume
e a moça e seu perfume
- de carne e osso e pétalas
e todas as partículas de perfume - 
puderam te imergir.
obviamente um poema
também não tem gosto,
mas inunda de água tua boca
- como um rio corrente
ou uma tempestade torrente -
se fala de fruta fresca se fala
de banquete.
um poema indubitavelmente
não tem mãos nem dedos nem braços
ainda assim te toca e te envolve
num longo abraço
- se por ti tem apreço -
ou te fura
te corta e te sangra
se por ti tem apenas pressa
e gana de ver tua pele aberta.
finalmente, um poema também
não tem imagem alguma
não traz fotos não traz focos
não é fotografia é pura ortografia
unidimensional e plana
puramente plana
todavia atiça teus olhos
- talvez até arrepie
teus cílios -
se te traz o nome do teu filho
se traz escrito e descrito
- com todas as letras
no papel -
as características de um rosto amigo
os adjetivos de um amor antigo
os substantivos do teu quarto.
um poema não tem som 
nem cheiro nem gosto
nem tato nem imagem
tem só um amontoado
de palavras e fonemas
que eventualmente já passaram
pela tua vida pelo teu ouvido
e despertaram teus sentidos,
talvez você tenha só esquecido.

foges do que?

no fundo
não existe
superfície

sexta-feira, 13 de julho de 2012

vai e volta

vai e volta
o passado tá preso
a gente que solta

quinta-feira, 12 de julho de 2012

voz da casa

a casa cresceu
sem aumentar
um metro um mísero
centímetro.
no sinteco
ecos riscos
do atrito entre
passado e presente.
embaixo do sofá
sob da cama
só pó
um par de tênis esquecidos
e nenhum pio
apenas a lembrança de dois pares de patas
que hoje habitam
- além do meu peito -
o vazio.

geografia do poema

o poema nada mais é
que a geografia
dos fonemas.
ante a folha em branco
desenham-se mapas
cartas de navegação
em direção ao desconhecido.
munido da bússola coronária
e caravela cerebral
o poeta passeia 
mapeia a latitude e a longitude
de cada palavra
e lavra o papel 
que ao tornar-se foz
- de sentimento 
e espanto -
ganha voz. 

a morte

é distante o mundo
dos mortos do mundo
dos vivos.
anos luz de escuridão
– num abismo
de sonho e
lamentação –
separam os que se foram
dos que ainda vão.
mesmo longe mesmo
distante quase a perder de vista
é como se morte e vida
se esbarrassem numa breve visita
– no milésimo
de segundo – em que nasce uma dor
(que não se explica)
trazida por quem vai
para quem aqui fica.

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Hype

o pêlo branco
– brando de paz
branco de neve –
misturou-se às cobertas
confundiu-se ao edredon
na hora de dormir
por 11 longos – e hoje
saudosos – anos.
dói pois anoiteceu
ela dormiu
e cá estou eu.

a parte que fica

toda perda dói
toda partida parte
a gente igualmente
em pequenos pedaços.
cacos de nós
mesclados com os de quem se foi.
dói toda perda
toda partida
porque a gente sabe
que os mortos já não podem ouvir
– nosso coração
batendo no peito
nosso amor transformado
em verbo
em verso –
por mais que se tente
nem nós podemos ouví-los
– nunca mais –
igualmente.

amor canção

o amor que volta
nunca é igual
soa diferente
como uma canção antiga
que pelo tempo corrido
parece ter mudado de notas
de melodia
e ganho nova releitura
– com novas notas
novo arranjo
nova partitura –
mas eventualmente ainda
agrada-lhe ao ouvido.
aproveita então este amor que regressa
aproveita com gana com pressa
pois pode chegar o dia
em que ele suma e torne a voltar
mas não mais irá comover-te em dança
– ou agradar-lhe ao ouvido –
sua nova melodia.

de passagem

tudo passa
nada fica
quem explica

epide(r)mico

a paixão
é epidérmica
o amor
é epidêmico

terça-feira, 10 de julho de 2012

certeza madura

a vida traz umas certezas
sem hora marcada
nem data definida
pra acontecer
certeza que pega de surpresa
quando a gente
menos espera
quando a gente
achou que não era
mais pra ser
mas pra vida
promessa é promessa
se não foi concreto
da outra vez
vai ser dessa

quinta-feira, 5 de julho de 2012

flor hemorrágica

vai chegar um dia
em que nem a poesia
vai segurar
– e por que não
adoçar
com sua natureza
branda de cor anil
e sabor anis –
a amargura
que a vida
costura
ao nosso peito,
aberto
como uma flor
de pétalas vermelho-vivo
hemoglobínicas.
uma flor hemorrágica.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

amor antigo

como pode um amor antigo
manter-se vivo?
depende (apenas)
do meu sangue
das minhas células
e dos meus sentidos
pra que ele se mantenha ativo?
um amor antigo é um milagre
um sistema retroalimentável
auto-sustentável
algo como uma   
estrela que brilha 
- tão vívida - 
ainda que a anos luz de distância
brilha perto tão perto
dentro dos nossos olhos
mesmo depois de finda.
vai ver que amor antigo
é coisa assim: que já viveu
mas não morreu ainda.

a caso do acaso

o acaso é
justamente
aquilo
que a gente
achou
que não
vinha
ao caso.

por enquanto

um grito ou
um susto ou
o som dos ossos
em atrito.
do amor
eu quero
é isto.
o vergão
na pele
o verão
na alma
a faca
na carne
a marca
no cerne
no âmago
o frio
no estômago.
do amor
eu quero
a parte real
tão concreta
quanto o concreto
cinza e batido
do chão
a parte motriz
que circula
o sangue
que transforma
em mar
o mangue.
o resto
o sonho
o encanto
eu deixo
de canto
– ou para os
filmes hollywoodianos –
por enquanto.

terça-feira, 26 de junho de 2012

improviso pra menina do sorriso bonito

tem sorriso
que é gritado.
sorriso brabo
que morde forte
agarra
que rasga
o peito
de um jeito
que nem pede
licença
e que a mão
não alcança
pra arrancar
de lá.
sorriso que
se tranca,
que se empenha
em entrar
e se entranhar
nas veias
nas células
nos músculos,
sorriso
que dispara
o coração
num tiro
certeiro
e faz a gente
em pedaços
pra poder ser
inteiro.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

o mundo

o mundo é gelado.
como um grão
de areia seria
se fosse sozinho
num deserto imenso
de sol tão intenso
que derretesse
a si próprio.
o mundo é tão
gelado quanto
a chuva que pinga
torrencialmente
na pele nua
que lentamente
fica úmida de frio,
arrepiada
e gelada
como o mundo.
o mundo é gelado
como um bom dia
não devolvido,
como um silêncio
não interrompido,
gelado como um
estampido de saudade
que implode o peito
e abre uma caverna
de dimensões
estratosféricas
que fere
com um corte
preciso
um corte
perfeito. 
o mundo é gelado
porque não tem tempo
pra ser quente,
por mais que tente.
porque não pode
parar de girar
a incríveis milhares
de quilômetros por hora.
por ora, o mundo é gelado
porque as pessoas
também não têm tempo
pra serem quentes.
porque as pessoas
estão doentes
e geladas como o mundo,
que é tão gelado
quanto o grão de areia
sozinho no deserto,
quanto o bom dia
não devolvido,
quanto o silêncio
não interrompido,
quanto o estampido
de saudade e finalmente
quanto à chuva
torrencial que molha
a pele,
que se arrepia
só de pensar
em passar
nesse mundo
mais um dia.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

instinto extinto

a mão
no fogo
o medo
da dor
futura
queimando
o peito
cadê?
o pavor
da sombra
do brilho
da lâmina
da solidão
cadê?
o receio
a chance
da cara
provar
o gosto
do recheio
do muro
cadê?
cadê?
cadê?
o amor
torna
extinto o
instinto.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

angu de angústia

angústia
dura
que
perfura
o peito
e perdura
e perdura
e perdura
e se perde
entre
estilhaços
da ossatura
toráxica
porosa
angústia
dolorosa
respira
fundo
fundo
fundo
o ar
até não
sobrar
mais o que
respirar.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

veja pelo lado bom

na corda bamba
a gente
samba

encantado/encontrado

príncipe
(encantado),
princípio
de um
precipício
profundo.
edifício
negativo
que leva
pro fundo
que leva
pro limbo
da alma.
porque
toda busca
– a de Pessoa
e por que
não de todos
nós?
pelo que
é
só se for
imaginado –
é sempre
vã.
ontem
hoje
amanhã.

sábado, 16 de junho de 2012

sinto, logo existo

sinto muito
quando
não sinto nada

quinta-feira, 14 de junho de 2012

habitado

amar
transforma espaço
em lugar

por quê?

é só parar
pra ver
pode crer:
amor
sem pé
nem cabeça
pega no pé
e gruda
na cabeça
antes
que você
esqueça.

máquina viva

que inveja
das máquinas
veja:
seria perfeito
se um dia
a gente tivesse
no lugar do peito
um disco rígido
tão flexível
a ponto
de apagar
cada megabyte
de memória
viva
indesejada.
seria infalível
limpar o que
não presta
pra poder
guardar o que
resta.

era não

era
uma vez
que não
era.

coisa de louco é pouco

amor
é coisa
de louco:
estraga
se for muito
estraga
se for pouco.

fome de nome

gosto de
certeza.
verdade limpa
cartas sobre
a mesa.
talvez
não tem vez
comigo
meu amigo.
eu alimento
o que me farta
de garantia
que é,
não de que
vai ser
um dia.
hipoteticamente
falando
eu afirmo
categoricamente
gritando:
sentimento tem
que ter
rosto nome sobre
nome e pronto.
e ponto.
se não tiver
eu deixo morrer
de fome.

fim?

tem caso
que não
casa com
a realidade.
caso que é
coisa da
cabeça
e por mais
que pareça
ser coisa
concreta
– de carne
osso pele
matéria –
é coisa feita
depressa
da pressa
de querer
que o que
não é
venha a ser.
caso sério
esse tipo
de caso.
sério.
caso que nos torna
involuntariamente
voluntários de
um amor uma
paixão uma
vontade uma
saudade que
a mente
arquitetou
e se esqueceu
de avisar
a gente.
é caso sério
caso assim:
que nem
começa
e a gente
não consegue
pôr fim.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

sem

falta.
só existe
enquanto
sobra.




terça-feira, 12 de junho de 2012

em toda parte

só faço
parte
do que
me faz
inteiro.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

do amor e seus formatos

o amor
não liga muito
pra esse
assunto
de formato.
quando intenso
– de tão imenso –
mal cabe
no quarto.
mas de vez
em quando
se basta
num retrato
3X4.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

verbo do peito

o verbo
comum
– da boca –
fala pouco
demais.
é só
som
voz
mera
vibração.
o verbo
do peito
é o que
reverbera.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

breve

toda viagem
é pouca
– curta
demais –
quando
o céu
é o
da boca.

terça-feira, 5 de junho de 2012

de novo

tenho vontades
a esmo
de querer
tudo novo
até que
o novo
vire mais
do mesmo.

domingo, 3 de junho de 2012

silencio o mundo pra me ouvir melhor

o silêncio
que constrói
muros e
cercas e
divide o
mundo do
lado de
dentro do
barulho do
lado de
fora.
equilibra
as ausências
de sons
em uma
melodia
sensitiva
de pausas
e vírgulas
abertas e
fechadas.
o barulho
é a fachada
do caos.
basta um
ruído e
o mundo
está ruindo.

sábado, 2 de junho de 2012

tudo é o que não parece

a vida
é mal
resolvida

sexta-feira, 1 de junho de 2012

metAMORfose

roma
roam
ramo
rmao
rmoa
raom
mora
moar
maor
maro
mroa
mrao
orma
oram
omar
omra
oarm
oamr
arom
armo
aorm
aomr
amro
amor

dor gêmea

essa dor
eu conheço
de cor.
sim.
tin tin
por
tin tin.
cada centímetro
do seu
perímetro.
angústia
íntima.
me olha
dentro dos
olhos no
fundo da
alma,
como se me
conhecesse
mais que eu
– porque talvez
até conheça,
já que vive
entranhada em
minhas
velhas veias
que bombeiam
esse resto
de vida
em pó –.
dor que
me estraçalha
o peito,
que dói
porque precisa
viver.
dor escura,
sem cor.
dor do não,
do fim,
dor que geme
dor gêmea.
essa dor
conheço
de cor.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

sem ênfase
tudo é
fase

terça-feira, 29 de maio de 2012

teu nome se perdeu na minha boca

teu nome se perdeu
na minha boca.
agora ele fica
circulando e
circulando
por ali,
entre um suspiro
e outro entre
um segredo e
outro.
teu nome se escondeu.
atrás dos meus
dentes dos meus
músculos
sob a língua.
teu nome é essa
íngua que me
inflama esse
vírus que me
acomete.
teu nome se perdeu
na minha boca.
secou a saliva
enrugou a garganta
ressecou as gengivas.
teu nome se entranhou
nas minhas cordas vocais
rachou meus lábios
sumiu com o meu
sorriso.
teu nome se perdeu
na minha boca
e não consegue
sair.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

lugar-pessoa

é lá que
a vida fulge.
é lá que
o medo foge.
é lá que
eu me
perco.
é lá que
eu me
encontro.
é lá que
a realidade
transborda.
é lá que
o sonho
transforma.
é lá que
meus joelhos
amolecem.
é lá que
minhas lamúrias
adoecem.
é lá que
o sol brilha
doce.
é lá que
nada seria
se lá não
fosse.
é lá que
o futuro
espera.
é lá que
o presente
estala.
é lá que
a chuva
lava.
é (pra) lá que
o peito
leva.
é lá.
ela.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

manhã de outono
árvores se desnudam
primavera no chão

quinta-feira, 24 de maio de 2012

manha

o peito
que a gente

ao peito
que a gente
ganha.
amor é
isso,
o resto é
manha.

mínimo múltiplo incomum


você não me dá
a mínima
e mesmo assim é
o máximo

terça-feira, 22 de maio de 2012

esperânsia

tanta espera
e meu peito
não esfria

segunda-feira, 21 de maio de 2012

dosexata

tudo vem
na dose
exata
pra gente
querer
exatamente
mais
ou menos.

alumiar

nem toda
luz
é como
a tua.
assim como,
nem toda
luz
da rua
é luz
da Lua.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

o sal do mundo

toda lágrima
tem o peso
do mundo.
pois pouco
importa
o mundo
porta afora.
importa
o mundo
daquela hora
daquele segundo.

existir no outro

de repente
a gente
se pega existindo
mais nos outros
– ou num outro
só –
que em nós.
a gente
se esquece de que
certamente
uma coisa existe na outra
desigualmente
de um jeito diferente
obtuso
total e completamente
confuso.
quando isso
acontece
parece
que a nossa existência
perece.
a gente não consegue
existir completamente
em nós
nem no outro
igualmente.
viramos um pedaço
semi-existente
mutilado
inconsciente
ambulante
buscando encarnar
num novo
presente
– ou só encarnar
novamente –.
como isso doi.
querer
– às vezes precisar –
que o outro exista
na gente
exatamente
do mesmo jeito
da mesma forma
do mesmo modo
que a gente
existe
no outro.

quando o silêncio pede a palavra

ouço tudo,
querida.
que não sou
que não somos
nada.
ouço
teu soluço
me roubar
o ar,
teu mar
de impasses
me salgar
as feridas.
ouço você
se afogar
(em lágrimas)
achando
que assim vai
se salvar.
eu ouço tudo
tudo tudo tudo
o que for
preciso.
mas por
favor
por Deus
por mim
não me obrigue
a ouvir o teu
silêncio.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

paichão

paixão
que é
paixão
joga
no chão
tira a roupa
rouba o ar
rouba a cena
vai embora
e não acena.
vem
te testa
e te deixa
nu
sentado
com um beijo
na testa
procurando
o fôlego
que
- nem sempre -
resta.
porque
paixão
que é
paixão,
quando acaba
a gente pede
um tempo
- e perde
um tempo -
a sós
pra ter certeza
se quem
se foi foi
a paixão ou
fomos nós.

domingo, 13 de maio de 2012

fim do fim (de semana)

toda segunda
o relógio
desperta-dor

lobotomia

toda memória
é cicatriz.
uma marca
uma história
que ficou
porque quis.
um sorriso
uma fala
que o tempo
não diz
(mais).
um gosto
um rosto
que se foi
sem ir.
toda memória
é cicatriz.
que,
por um triz,
ainda dói.

sábado, 12 de maio de 2012

ana

assim
que nasci,
quem
começou
a crescer
em mim
foi você.
bem no centro
no meio
do peito do lado
de dentro.
você.
tua carne
tua alma
meu cerne
minha calma.
tudo meu
tem você.
porque se
não tem
não é meu,
meu bem.
tudo
tudo
tudo
cada passo
cada osso
cada traço
cada nervo
cada pulso
cada movimento
cada impulso
cada momento.
tudo teu.
minha gênese
tua
minha origem
tua.
início
e
fim
e
assim
vai ser
até quando
Deus quiser.

terça-feira, 8 de maio de 2012

talvez mata mais que não

tudo
que fica
inacabado
acaba
comigo

segunda-feira, 7 de maio de 2012

o que me
falta
não me
faz
(falta).
só o que
trasn-
borda
trans-
forma.

sábado, 5 de maio de 2012

tudo o que é
intenso e fica
intensifica.

pousa

toda coisa
vem assim
meio insegura.
não sabe se vai
nem se fica.
então,
quando vier
e valer,
se estica e 
segura.
porque tem coisa
que vem e não fica.
só pousa.

edifício

é difícil
existir.
a vida é
insegura
além da conta.
ora dói
ora cura.
ora é lisa
ora cheia de ponta.
é difícil 
existir.
tudo é pressa.
ou se existe agora,
neste segundo
e ponto
ou se desiste dessa
de existir
e pronto.
é difícil 
existir,
assim, no infinitivo,
pois não se pára para 
existir.
só se existe
existindo
- e isto é definitivo-.
é difícil 
existir
com todo esse tchau
e todo esse oi
do presente 
que devia ficar,
mas já foi.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

viver não tem senha
ou vem agora
ou não venha
a vida escreve
o que quer
não o que deve
síntese louca
sente-se muito
a vida que é pouca
mais dia
menos dia
um dia
mais ou menos

busca

a vida é
uma procura
sem cura.
busca desesperada
por achar até
que se ache
não precisar mais.
procura desenfreada
por tudo que carrega
– em sua natureza conferida –
uma possibilidade remota
de não ser achado.
porque o homem
vive
– à medida e só –
enquanto procura.
pois quando (se) encontra
– pouco ou nada –
dura.

(de)missão

nada adianta
quando o nó da gravata
vira o nó na garganta

o tempo das coisas

as coisas morrem
porque se cansam
de ser.
pouco
(ou nada)
têm a ver
os relógios que contam
o tempo que escorre
dos olhos
dos homens
– tempo que corre
se conta e
se desconta
inteiro e
sem qualquer
ponteiro –
porque o tempo
das coisas
está
no destempo
de ser e de
estar
na iminência
de acontecer.
porque
as coisas
são o tempo
das coisas.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

cor

tem gente que é
como chuva de verão.
vem
molha
venta
tira tudo do lugar
e não fica pra contar
história.
mesmo assim
a gente quer
se encharcar
dessas pessoas.
sentir as roupas
grudando no corpo,
a água batendo no rosto
e esquecer do resto.
porque da chuva
que evapora
e das pessoas
que vão embora
sobra o
arco-íris.

ouvindo o mu(n)do

ninguém ouviu
– ou viu –
o despertar de um sonho
naquela noite fria.
mas entre o bater dos dentes
ele timidamente
nascia.
sem anunciação e
sem aviso prévio
tomava forma
na porta de um prédio
na Alameda Santos
– onde curiosamente
todos os santos
pareciam ter se reunido
pra assistir ao sonho
que estava vindo. –
naquele momento,
a realidade era pouca
fugaz,
limitada.
por isso nasceu o sonho,
pra deixar na boca
o gosto de uma realidade
inventada.
foi ali,
naquele minuto,
que sumiu toda física,
toda gravidade,
todo peso do corpo
e o mundo ficou
mudo.
foi então,
que eu pude
– pela primeira vez –
me ouvir melhor.
só quando silenciou-se
tudo.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

quando aquém vira além

o melhor
modo
de curar
o desejo
que ficou
é deixar,
até que ele
– sozinho –
deixe
a desejar.

des-deseje

o desejo
que a gente
tem
é o mesmo
desejo
que o desejo
tem
de ser
(da gente).
porque
pra que
ele seja desejo
é preciso
que a gente
deseje,
que a gente
nos deixe
desejar.
por isso,
por mais
que
se tente
mandar
embora
um desejo
não depende
só da gente,
depende dele
igualmente.

vide o verso

tem verso que
cai bem no papel.
cai suave
como se aquele lugar
fosse seu
(do verso)
e sem ele
(o lugar)
o verso não pudesse
ser
– e todo verso preso
tem pressa de ser
porque até ser
é presa de si –
e verso
que é verso
precisa encarnar
em qualquer coisa
que lhe dê sentido
ou que lhe dê
ouvidos.
o que o poeta faz
– ou tenta fazer –
é silenciar o mundo
para ouvir o verso
(por vezes mudo)
que sibila
em sílabas tônicas.
o poeta se empenha
– e é quase perito –
em transubstanciar
o verso que estanca
no peito,
no verso que estampa
a folha em branco.
porque o poeta sabe
que só ele
dá vida ao verso
e vice-versa.

sua voz

tem voz
que quando soa
a gente sua

segunda-feira, 23 de abril de 2012

tudo vai virar poesia

poesia é a forma
mais simples
– e mais intensa –
de existência.
tudo o que existe
já virou poesia.
até o que ainda resiste
vai virar um dia.

enconstrói

a cada encontro
você me constroi
por dentro

sexta-feira, 20 de abril de 2012

mangue

tem dias
em que a gente pisa
e o pé afunda
(porque precisa).
entra todo
no lodo da alma
e cria raízes.
nesses dias,
nessas crises,
eu me olho
lá no fundo
e reaprendo
a conviver
com o que
teoricamente
a gente
evita para viver
– ou vive para evitar –
sair dói.
e demora.
dói a demora.
mas não importa.
eu tenho calma
(eu ainda tenho alma)
e tempo de sobra
pra ficar,
até sobrar
do mangue
só o mar.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

momento-poesia

poesia é sentimento
e vice-versa.
é verso sobre verso.
como se cada um
fosse sedimento integrante
da rocha intrigante
que a gente traz no peito.
poesia é esse desprendimento
do que está incrustado
no âmago do que a gente sente
naquele dado momento.
e a gente precisa de sentimento
pra ser e
pra continuar em movimento.
logo, a gente precisa de poesia
pra viver e
pra perpetuar o sentimento.
porque a gente
só sabe que é,
com certeza,
quando sente.
senão a gente
só tem a ideia
de que é
sem ser
realmente.
portanto, pouco importa se faz sentido
ser feliz pra depois sofrer
(pra ser feliz pra depois sofrer de novo)
porque o sentimento entra sem bater
e bate a porta.
o que importa é ter sentido o gosto.
ter sentido o riso
fazendo cócegas no rosto
ou a lágrima inundando a alma.
por isso, digo aos racionalistas
e lamento:
sentimento não tem
que fazer sentido
tem que fazer sentir.
como qualquer coisa na vida
que ultrapasse o entendimento.
como qualquer momento
que um dia
foi ou vai ser
poesia.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

esse buraco

a gente sente
que sempre tem
algo que não tem
na gente.
a começar pela própria
ideia de faltar em nós
uma parte ou parte uma.
algo que parte
sem ao menos
ter chegado
em parte alguma.
um espaço indefinido
entre nós e nós.
algo que suspende
a vida antes mesmo
que a gente suspeite.
um buraco cheio de matéria,
energia,
silêncio,
sentimento.
uma ausência com essência,
cara,
rosto
e gosto
de preenchimento,
que nos segue e nos persegue
pelo lado de dentro.
a gente quer porque quer
expulsar do centro
esse vão, faça o que fizer.
mas como se elimina algo
que não se mostra?
que não se ilumina?
como se extermina um excesso
que peca por viver do avesso?
sobrando o mesmo tanto
que falta,
faltando o mesmo tanto
que sobra?
pra essa obra
não sei se tenho tato,
mas sei que tenho
tentado.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

fulgindo

quando longe
(de você)
a vida não fulge.
corre ávida
como quem foge.
e tudo vira meio,
quase,
metade.
como se eu fosse
só um pedaço de início,
sem fim.
mas aí você vem,
me envolve
e me devolve
pra mim.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

plenos planos tolos

esses planos longínquos
que os tolos vivem fazendo
muito me intrigam
e nada me comovem.
plenos são os gênios
que descobriram a magia do instantâneo
e vivem pílulas de vida
ingeridas sem prescrição
e sem preocupação.
porque, amigo, pode ter tudo
pode ter grana
pode ter gana
pode ter fé
pode ter o que quiser
mas muito se engana
quem pensa que a vida
vai ser
porque a vida
é.

esta poltrona

escrevo sentado
numa poltrona com capa.
um pano vincado
que gentilmente se propõe
a proteger o estofado.
então toda a vida
que já se sentou nesta poltrona
ficou retida neste pano.
contida em milhões e milhões de fios
de um tecido frio.
todos os fios de cabelo
que um dia caíram aqui,
todo calor desse corpo
que um dia residiu por aqui
ficou em suspesão.
viveu no intermédio
de uma membrana
50% algodão
50% poliéster
um dia ainda tiro
esse pano daqui e fim.
porque eu sinto que
mais que proteger a poltrona
ele quer proteger-me de mim.

do amor

e o que é o amor
senão este pulso
que nos vira do avesso?
que transforma víscera
em verso?
um organismo que come
nossas palavras
- todas elas -
e nos alimenta
como crias de si próprio
como extensões intensas
incrustadas e envoltas
por camadas e camadas
de placenta.
o amor pari pra poder viver
pra deixar de vir-a-ser
pois não se cabe
não se comporta.
precisa de rosto para ser
precisa de gosto para ver.
por isso, somos frutos
do nosso próprio amor.
polpa de sentimento
espremida e exaurida
até o caroço.
poupa desentendimentos
quem entende que amor
não é roupa
é pele
é célula
é núcleo
é gênese
amor é a menor
partícula de vida
inexistente a olho nu.
então não tente
ver o que é amor
porque se for
você sente.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Dorme

foi ontem que
ficou pra trás
o tanto que
sobrou de nós

no céu de abril
no véu que serviu
no teu seio frio

será que o tempo
entende? dói
porque ainda
tem de nós

no nó da gravata
no pó na gaveta
no nó na garganta

o tempo que
se renda, pois
eu quero
mais nós dois

na beira da cama
na banheira que chama
na vida inteira que espera

da qualidade de concretude

benigno antígeno
digno danificado
dignificado
ígneo finado
signo fincado
significado

terça-feira, 10 de abril de 2012

Ícaro

da cera
e do sol
só sobrou
o sal.
do que era
entre nós
o só
sobrou.
fiz como
Ícaro,
caí em mim.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

(eleva)dor

antes de entrar
verifique se a mesma
não se encontra
parada neste andar

quinta-feira, 5 de abril de 2012

partiu com parte de mim

tô à toa
desde quando
cê disse que não
tava na boa

que queria conversar
mais tarde
mas que amanhã
era tarde demais

agora teu nome
não me sai da boca
teu cheiro deitou
no meu travesseiro

sinto que não tem sentido
te esperar aqui sentado
mas toda vez que levanto
o coração pesa, ah, pesa tanto

liga logo pra por
de lado essa angústia
chega logo pra por
gelo nessa dor

quarta-feira, 4 de abril de 2012

susto/surto

o surto
de querer
ser
faz
sem querer
a gente
ser
no susto

terça-feira, 3 de abril de 2012

expectativa

perfeito.
a gente imagina
e tá feito.
magina.
antes fosse assim.
toda expectativa
tivesse o fim
que a gente pediu
que a gente previu
desde o começo.
mas o buraco
é mais embaixo,
mais no fundo.
muito mais profundo.
enquanto a espera
não acaba
a cabeça cava
à beça.
a cabeça
prega peça
e não há
quem impeça
que essa expectativa
cresça.
que a gente caia
na ilusão
de enxergar sim
no lugar de não.
o negócio,
meu irmão,
é se preparar
pro que der
e pro que
não vier.

domingo, 1 de abril de 2012

1º de abril

um dia todo
pros que mentem
o dia todo.
pros que metem
os pés pelas mãos.
pros que vivem
cruzando até
os dedos do pé.
pros que falam
e desfalam.
pros que nos
fazem desfalecer.
pros que vivem
mas nunca vão ser.
pros que têm várias caras
e todas duras.
pros que escondem coisas
porque nunca se acharam.
pros que fazem doer
o que a gente tem no peito.
pros que têm
o nariz comprido
e a perna curta.
pros que juram
de pé junto
mas vão acabar
sozinhos.
pros que se esqueceram
de lembrar.
pros que lembraram
e se esqueceram de dizer.
pros que cresceram
e ainda brincam
de esconder.
pra vocês,
o primeiro pedaço de bolo

sexta-feira, 30 de março de 2012

issó

estar só
é estar só
e só

o

o não
faz a gente meter
os pés pelas mãos

semsura

toda censura
é insensata.
inexata.
é dura
mas não
dura.
não acaba
com nada.
deixa tudo
pra depois.
pra acontecer.
pra vir a ser
e explodir.
aborto espontâneo
de um sofrer
momentâneo.
um silêncio gritado
que corta as paredes
da garganta.
que pega o proibido
e canta
e cala.
porque censura
é avessa ao movimento.
é não-desenvolvimento.
é des-envolvimento.
mas enquanto
o peito fizer som,
enquanto sim
for melhor que não,
censura nenhuma
segura.

cereja

certeza
não é nome.
é laço.
traços
que se cruzam,
braços
que se encontram.
certeza
não tem selo.
tem zelo.
tem o que falta
pra ser possível
dividir por zero.
porque rótulo
é massa igual
pra todo bolo.
mas só tem cereja
onde tem certeza.

quinta-feira, 29 de março de 2012

gangrena

teu silêncio
é só teu.
eu não ouço.
não mexo um osso
enquanto você
se tranca
nesse calabouço.
que gangrenem
tuas cordas vocais.
que enrugue
tua alma.
que tire teu juízo
essa calma.
que tranquem teu corpo
e joguem o coração fora.
pra que ele bata
bata
bata
bata
pra que ele canse
canse
canse
canse
pra que você torça
torça
torça
torça
e ninguém ouça.

quarta-feira, 28 de março de 2012

aqui

tá na cara
que tua cara
continua
sendo a minha.
um par ímpar
nosso e só.
singular.
junto e todo.
colado.
tá na cara
que tudo mudou
e tudo ficou.
mudo.
inabalado.
perto.
esperando
de lado
do lado.
inacabado.
tudo na mesma.
eu aqui
e você
aqui.

terça-feira, 27 de março de 2012

é

amor é quando a gente se divide pra ser mais inteiro.

tonto

quero tanto
teu tato
no meu
que meu teto
vire teu
e meu tanto
seja o bastante.
eu tento
tento tanto
mas enquanto
teu pranto
de desencanto
te sustentar,
eu me prometo
que tento
não esquecer
de tentar ir
e não voltar.

sexta-feira, 23 de março de 2012

falando geometricamente do amor por outro ângulo

caso raso
amor oblíquo
dor aguda

ene-a-til-o

estrela
não fala
cotovelo
não fala
universo
não fala
o inverso
não fala
verso
não fala
sorriso
não fala
Deus
não fala
céu
não fala
astro
não fala
rastro
não fala
destino
não fala
esquina
não fala
se menina
não fala
só silêncio
fala

des-pedida

uma hora
tudo vai.
pessoa vai
amor vai
dor vai
cor vai
colo vai
dolo vai
choro vai
ombro vai.
difícil na vida
é se despedir
da despedida.

pessoa

fingidor
não finge dor
finge amor

ode à ida

unha roída
alma moída
corpo doído
copo vazio
sangue pisado
sonho pesado
caso passado
dor presente

quarta-feira, 21 de março de 2012

abril

o choro
cessou
o coro
calou
o coração
colou
a lágrima
secou
o novo amor
chegou
a solidão
sumiu
viu?
depois
de março
sempre
vem abril

terça-feira, 20 de março de 2012

pressa

me empresta
tua pressa
que impressa
em mim
me impeça
de doer

segunda-feira, 19 de março de 2012

Poemínimo

mimo
nenhum
é mínimo.
mesmo
minúsculo
se te move
um músculo
já é maiúsculo.
um ósculo
que seja.
um ensejo
um desejo
que viaja
um bocejo
um cortejo.
veja:
todo pormenor
por menor
que seja
é.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Dia Nacional da Poesia

escrevo como
quem doa roupas
que já serviram,
que servirão.
para os que vivem
e os que virão.
sob medida
para aquecer
esconder
abrigar.
poemas de lã,
versos de linha.
porque sua necessidade
de ouvir
pode ser a mesma
que a minha.

terça-feira, 13 de março de 2012

De tempos em tantos

Tanto faz se faz um mês ou três.
Tanto fez, tanto fiz,
mas diz se nossa
história tem bis.

Tempo faz que fez
fica e não passa em vez
de passar tudo pra trás
e te levar de vez.

A vida vai te levar embora,
embora agora pareça que não.
E quando for, vai levar seu não
e esse vão que não vai.

Aí descubro o tanto
que leva pro tempo levar
e o tempo que leva
pra vida relevar.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Gênio(s)?

não se davam
por questão
de gênio

não ficaram
por questão
de burrice
sete blusas
o vento corta
entra e me veste
dia nublado
casal em casa
noite molhada
venta forte
a samambaia
quer sambar
janela aberta
pousa a joaninha
que sorte a minha
noite escura
luz no fim do túnel
um vagalume
lago em movimento
não há ninguém
só o vento
pássaros no ninho
sem pedir licença
nasce o passarinho

terça-feira, 6 de março de 2012

só se

pense
se convém
convence

Carmela

você vem
e eu fico
nessa pressa
de querer
que o que
não é
venha a ser

de(seja)

a gente deseja
o que não é
mas talvez seja

âncora

tudo prende
a gente sofre
mas aprende

no metrô

metrô lotado
me mexo
estando parado

segunda-feira, 5 de março de 2012

Alice

quando leio Alice
leio meu eu
que outro alguém disse

amor defeito

amor perfeito
meu bem
só flor

bem-te-vi

bem-te-vi
te vi bem
mas não tive

endorfina

dor fina
doi e vira
endorfina

não sabe

dor menina
não sabe passar
a gente ensina

domingo, 4 de março de 2012

labuta

trabalho
penso: bom
digo: caralho

sexta-feira, 2 de março de 2012

entregue

estou entregue
você me tenta
e consegue

Receita

vem pela
contramão
me encontra
sem dizer não
me desorienta
me tenta
me encanta
é oito
ou oitenta
não inventa
vem e
aproveita
sem receio
vem
que a receita
você já tem

quinta-feira, 1 de março de 2012

a dor que era também reverbera

a dor
que dura
te adora
te atura
te arquiteta
te dedura
reverbera
a amargura
e as lamúrias
e memórias
musicadas
em notas graves
e claves
de sol
apagadas

Quente dor latente

faz calor
a solidão é fria
quente é a dor

Tampouco

tem sim
que é não
tem fim
que é bom
a gente tenta
entender
e acertar
o tom
mas tem pouco
que vira tão
em tão pouco

Corta (sob encomenda)

devora a corda
que prende
sufoca
acorda
recorda agora
a hora
que não há
e não demora
em digerir
os fios
do tempo
e as fibras
do corpo
corta esse
cordão umbilical
com a angústia
que te chama
e abre a porta
aborta
esse medo
e ama

aquelas que se formam quando você sorri

vida nova
toda vez
que me enterro
em suas covas

Inconcluso

não deu tempo
passei do ponto
tirei a tampa
tudo ficou
mudo
se perdeu
no enquanto
agora tudo
é no entanto
nem louco
nem santo
meu rouco pranto
é o que tenho
no prato
o que estampa
o retrato
desse réquiem
de porém

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Catarse

Cortar-se
agora depois
catarse.

Achados e perdidos

A gente
some
de nós.
De repente
volta
depois.
Quem
se perdeu
é porque
já se achou.

Última segunda

Uma a uma
toda segunda chance
é a última.

Feito nós

Feito nós
nós somos
feito nós
nós fomos
feito nós
defeitos nossos
refeitos nós
perfeitos?
Nós.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Liso

Calma.
Realizar é liso.
A espera é áspera.

Lâmpada

Mosquito na lâmpada.
Pousa e só.
Encontrou seu lugar ao Sol.

Inconstante

Chuva de verão.
Vem como se ficasse
vai como se não pudesse.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Hífen

A gente é
composto.
Mistura.
Plural.
Um
mais
um.
Adjunto.
Nome
e
sobrenome.
Somos.
Os pronomes
mais pessoais.
Um consenso.
Um acordo.
Duas almas
em um corpo.
Uma combinação.
Um círculo
vicioso
de amar
e não conseguir
parar.

Você não é

Você não é.
Mas tenta,
a todo custo.
Tenta.
E inventa.
Trinta, quarenta,
setenta.
Bem que
cê tenta.
Mas não é.
Como a chuva
na janela.
Que não é,
só está de passagem.
Como uma brisa
leve.
Que não preenche,
só sopra.
Você não é.
Nem a mentira
que te atura,
te arquiteta
nas alturas
das estantes
dos instantes.
Você não é
o que entende
por ser.
Porque você
não entende.
Nem procura
saber.

Recheio

Quem vive
com receio
nunca chega
no recheio

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Minha vida sem mim

Dia nublado.
Tudo o que sinto
ouço dublado.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Quero você

Quero você.
Quero tanto você.
Quero me cobrir
de você.
Quero você
entupindo meus poros.
Quero teus polos,
teu colo,
teus seios,
anseios,
desejos.
Quero teus beijos
completando os meus.
Teus braços,
teus traços,
teus trecos.
Quero seu todo,
ser todo,
ser tudo
o que você quer.

Para Raquel.

O Meio

Oi.
Quando eu vi
já foi.
Um virou dois.
O singular ficou
pra depois.
Sem começo
nem fim.
A gente tá
no meio.
E tá bom
assim.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Faltava pouco. Não falta mais.

Faltavam dedos
entrelaçados.
Não faltam mais.

Faltava pele
com pele.
Não falta mais.

Faltavam beijos
sem fim.
Não faltam mais.

Faltavam noites nossas,
enfim.
Não faltam mais.

Faltava pouco pra eu
caber todo em você.
Não falta mais.

Faltava pouco pra você
sobrar em mim.
Não falta mais.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

1

De uma noite inteira,
bastou um segundo
pra você ser a primeira.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Claro

Não se adia
amor que faz
noite virar dia.

Dois meios

Só sou inteiro
quando dividimos
o travesseiro.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

(over)doses homeopáticas

Não sei amar
aos poucos.
Em pedaços.
Sou inteiro.
Todo.
Intenso.
Não morno.
Pra mim,
amor
é dose única.
À vista.
Oito ou oitenta.
Desculpe se minha
natureza
não lhe parece
simpática.
Mas eu
só sei amar em
overdoses
homeopáticas.

Dente do Siso

Grudo em você
e você me arranca
um sorriso.

Além Alma

Eu não sei amar
só com o corpo.
Amor torto.
Superficialmente
absorto.
Então,
quando eu te amo,
não me peça calma.
Porque meu corpo
ouve.
E só.
Mas meu amor
é extensão
da alma.

Meu bem

Encontrei alguém
que ao chamar
de meu bem
me chama
também.

Mesmo?

Não sou
sempre
o mesmo.
Mesmo
porque
nem mesmo
eu
sei quem
sou.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Tudo

Quanto mais
eu mudo,
mais
eu vejo que,
sem você,
eu tenho tudo.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Agora eu sei porque as ostras felizes do Rubem Alves não fazem pérola

Os melancólicos
não se contêm.
Os contentes
se contentam.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Pelo menos

Enquanto
um fala
o outro
não fica
mudo.

Pelo menos
a gente
concorda
que discorda
em tudo.

Urgência

A vida tem que ser
comida quente.
Viver é urgente.

Para Raquel.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

A moral da história

Enquanto
penso
não penso
em quanto.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

2 coelhos e uns nhoques

Para ser
inteiro,
este poema
tem que
ser meio.
Meio seu.
Meio meu.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Poesia é não

Poesia?
Você
merece
uma.
Essa aqui,
ó:
só pra dizer
que você
não merece
nenhuma.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Despedidas Remediadas

Despedidas.
Sempre
difíceis
no começo.
Bem, são.
Mas,
no fim das contas,
é tchau e benção.

E depois a gente sempre se levanta...

Toda queda
vive do medo
que dá.

Reação

A vida
(também)
revida.

(Re)luz

Sim.
Toda luz
ilumina.

Não.
Nem todas elas
fazem buracos
na escuridão.

Sol do meio-dia

Sol do
meio-dia.
Intenso.
Rubro.
Imenso.
Dele
me cubro.
Assim.
Na
tentativa
de ver
a sombra
no chão.
Não
em mim.

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Arte

E o que é
o amor
senão
a arte de
desaprender
a se desprender?

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Problema

Existe vida
após a morte?
Existe vida
após amar-te?

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Lusco-fusco

Ela é Sol.
Eu sou breu.
Ela é só.
Eu sou seu.
Ela é sim.
Eu sou também.